Políticas públicas identitárias e saúde no Brasil: impactos na população jovem, negra e indígena em municípios

Um grupo de homens indígenas com pintura facial está reunido em círculo. Ao lado deles, à esquerda da foto, um homem de costas veste um colete vermelho com a sigla SESAI, da Secretaria de Saúde Indígena.
Crédito: Ministério da Saúde

Políticas identitárias podem ser entendidas como estratégias e movimentos da sociedade civil organizada voltados para questões relacionadas à identidade de agrupamentos humanos específicos como a etnia, o gênero, a orientação sexual, a religião e outras especificidades sociais. Essas iniciativas visam defender os direitos de grupos oprimidos ou sub-representados e surgem da percepção de que algumas identidades sociais enfrentam desigualdades estruturais, requerendo atenção específica.

O Brasil, país multicultural formado pela junção de povos vindos de diferentes partes do globo, tem uma história complexa de formação identitária. Por aqui, as políticas identitárias emergem como uma resposta às desigualdades sociais e históricas enfrentadas por diferentes grupos populacionais, buscando justiça social e reconhecimento para populações historicamente marginalizadas.

A importância das políticas públicas identitárias para grupos minorizados no Brasil

As políticas identitárias são fundamentais para o pleno desenvolvimento da sociedade, pois representam uma resposta às desigualdades estruturais e históricas enfrentadas por essas populações marginalizadas. No Brasil, país marcado por profundas divisões sociais, raciais, econômicas e de gênero, as políticas identitárias desempenham papel crucial na promoção da justiça social e na redução dessas disparidades. 

A formulação e implementação de políticas coadunadas com identidades sociais contribui para a universalização do acesso a serviços essenciais para a população como educação, moradia, emprego e, claro, saúde. Inclusive, a incorporação de identidades sociais na formulação de políticas públicas de saúde é fundamental para garantir que os serviços sejam equitativos, acessíveis e adequados às necessidades dos diferentes grupos populacionais.

Na prestação dos serviços públicos de saúde, por exemplo, a coleta de dados agrupados por raça, etnia, orientação sexual, idade, classe social e distribuição territorial permite identificar desigualdades e consequentemente adaptar políticas públicas para enfrentamento das assimetrias na prestação dos serviços. 

As políticas identitárias de saúde têm impacto significativo na população jovem, negra, indígena e quilombola ao abordar desigualdades de acesso aos serviços de saúde, além de promover cuidados adequados conforme as especificidades de cada população. Sua implementação pode ajudar a melhorar os indicadores de saúde daqueles que enfrentam dificuldades que limitam o acesso a tratamentos e cuidados adequados de saúde. 

Uma das barreiras enfrentadas pela população negra, indígena e quilombola é o racismo institucional. A inclusão de representantes das comunidades negras e indígenas nos conselhos de saúde e em processos de formulação de políticas públicas permite que essas populações tenham voz ativa na definição de suas próprias prioridades de saúde.

Da mesma forma, o reconhecimento e a valorização das práticas de cura tradicionais indígenas e quilombolas dentro das políticas de saúde permitem uma abordagem mais inclusiva e eficaz. É importante defender o direito de grupos identitários manterem e promoverem suas culturas, tradições e formas de expressão como parte dos tratamentos de saúde. 

Não obstante, é fundamental estabelecer serviços de saúde específicos para grupos marginalizados, levando em conta as particularidades de cada identidade social. Clínicas especializadas em saúde da mulher, saúde mental para comunidades indígenas, serviços de saúde voltados para a população trans e prevenção de HIV em comunidades LGBTQIA+, por exemplo, podem melhorar consideravelmente os indicadores de saúde. 

Desafios na coleta de dados sobre saúde para populações vulneráveis em municípios brasileiros

A coleta de dados sobre saúde para populações vulneráveis é crucial para a formulação de políticas públicas eficazes e equitativas que garantam acesso universalizado aos serviços de saúde. Os desafios são enormes e envolvem desde barreiras culturais a limitações estruturais e falta de integração entre a implementação de políticas, além de pouca ou nenhuma preocupação com as identidades sociais. 

É imprescindível a digitalização da saúde e a expansão do uso da telemedicina não apenas para ampliar a cobertura, mas também para o registro eletrônico de prontuários e histórico de saúde da população. A ausência de sistemas informatizados de saúde e a dependência de registros em papel aumentam a chance de erros e perda de informações.

O site do Observatório da APS, por exemplo, reúne índices de saúde extraídos de diferentes pesquisas para consultas. Sempre que as fontes permitem, esses dados podem ser acessados segundo sexo, faixa etária, raça/cor e escolaridade, além da opção de delimitar os resultados por municípios brasileiros ou unidades da federação. 

Para pesquisas amostrais, como Vigitel e Covitel, é preciso ter cuidado ao acumular filtros. Mas fontes censitárias como o SINASC e SIM são valiosas fontes de informações para análises segundo essas categorias.

Porém, mesmo quando há coleta de dados, muitas vezes eles não são compilados por etnia, gênero ou localidade, dificultando a identificação de padrões específicos de saúde entre populações vulneráveis. Isso limita a capacidade de criar políticas de saúde específicas para cada grupo e o respeito às suas identidades sociais. 

A falta de coordenação entre municípios, estados e o governo federal pode comprometer a consistência e a eficácia da coleta de dados, levando à fragmentação de informações e dificuldade de análise dos indicadores de saúde.

Por fim, mas não menos importante, a falta de financiamento e apoio para pesquisas voltadas para populações vulneráveis contribui para a escassez de dados, limitando a compreensão das condições de saúde dessas populações e a formulação de políticas identitárias de saúde eficazes.